terça-feira, 8 de maio de 2012

Mário Crespo | Adriano Moreira

E ontem o Mário Crespo, a fazer de passista liberal austerista, surpreendido, não raro desgostado e às vezes agastado, ante um Adriano Moreira à sua esquerda, quase socialista, humanista, cristão…, viram?, ouviram?

Adriano Moreira, sobre o recém-eleito Hollande- … Ele tem uma grande parte de verdade no que diz […] De todos, até hoje, é aquele que não abandona a ideia do Estado Social, e é muito interessante esse aspecto em relação à Europa.
Mário Crespo, professoral, relvista- É preciso definir os limites e alcances desse Estado Social.
AM- O que não pode aceitar-se é que pura e simplesmente se ponha de lado [o Estado Social]. É como pôr de lado preceitos constitucionais. Os preceitos constitucionais não se põem de lado.
MC, como que sob procuração de Pedro Passos Coelho- Acha que a maneira como estamos a ser governados está a pôr de lado esse Estado Social?
AM- Eu acho que sim. […] Por exemplo, quando se diz que o ensino é tendencialmente gratuito, o que lá está escrito é que é tendencialmente gratuito […] Isso não pode ser substituído por uma linguagem, que começou a fazer carreira, em que realmente os estudantes deixam de ser estudantes e passam a ser clientes. […]
MC, pragmático, insensível, gaspar- No meio do vigor dessa contestação toda, apetece-me citar uma frase que eu julgo que foi o Francisco José Viegas que disse, num debate, “Que parte de Não há dinheiro é que o país não está a compreender?”.
AM - … Algumas das intervenções que o ministro do orçamento faz dizem exclusivamente respeito ao orçamento, e vai buscar a receita aonde estiver e não repara que, algumas vezes, a Constituição existe […] Já se verifica que se admite que o estado de urgência ou o estado de necessidade permite uma certa benevolência em relação a textos constitucionais. Isto não pode ser admitido!
MC, soletrando para que o professor não desaprenda- … o próprio professor Canotilho, e julgo que estou a citá-lo correctamente, disse que, numa urgência, a urgência é quem determina a interpretação final.
AM- Bom, eu acredito nisso, que a urgência muitas vezes determine a solução final,
MC, para quem a urgência é o valor soberano, interrompendo veemente- É o valor soberano!
AM- mas há um conselho que eu deixo constantemente: não se deixe dominar pela urgência. Em tantas circunstâncias da vida, não se deixe dominar pela urgência. […] O que está acima de textos legais é a concepção do mundo e da vida, porque é da concepção do mundo e da vida que depois se deduz o normativismo.
SIC Notícias, Jornal das 9 | 07.Mai.2012