sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Por exemplo, António Barreto

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Por exemplo, um sociólogo como António Barreto, a partir do momento em que começou a ter um discurso que já não é limitado pelas regras, pela ordem e pelo método de um determinado campo disciplinar, começou a ser chamado “pensador” […] Estes “pensadores”, ao contrário dos filósofos, têm um pensamento completamente transitivo, exclusivamente orientado para um objecto exterior. Têm uma pretensão de verdade e de revelação, e isso verifica-se no “estilo” e nos protocolos discursivos. Tendem, por isso, a ser ouvidos como oráculos. A filosofia, pelo contrário, conhece desde sempre o modo como o pensamento implica a linguagem. Para o filósofo, ao contrário do que acontece com o nosso “pensador”, não há pensamento que não seja pensamento do pensamento, não há pensamento que não seja experiência da linguagem. O “pensador” — a categoria portuguesa com este nome — está cheio de visões do mundo, mas falta-lhe aquilo que desde sempre sobra no filósofo: uma visão da linguagem, uma interrogação sobre o significado das palavras. Daí a ilusão de transparência que transmite, que é uma transparência ingénua, semelhante à dos poetas que têm muita coisa para dizer e muitos sentimentos para exprimir. São, à sua maneira, realistas alucinados.»