quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Acordo Ortográfico [101]

Nos últimos quatro minutos da "Quadratura do círculo" especial, na passada sexta-feira, 08.Jan.2016, na SIC Notícias, deu-se a conversa que se segue.

José Pacheco Pereira [JPP]- Eu acho que das coisas mais positivas que o governo tem feito é rever, revogar e reverter. E há muita coisa para rever, revogar e reverter, e uma delas é que se olhe de novo para o Acordo Ortográfico. O Acordo Ortográfico não é um mero tratado internacional como os outros. É um tratado internacional que uma parte importante dos países que falam a língua portuguesa não está a aplicar ou então têm-no no papel mas não o aplicam. É um factor importante de abastardamento da língua portuguesa. Há um conjunto de interesses económicos ligados ao Acordo Ortográfico que têm de ser acautelados, em particular as editoras — mas isso é possível fazer — de livros escolares. O problema é este: isto é uma questão que tem a ver com a identidade nacional. O abastardamento da língua portuguesa gerado pelo Acordo Ortográfico atinge esta situação absurda de haver jornais escritos em... antes e depois de acordo. Há uma parte significativa dos portugueses que não vai nunca escrever na base do novo acordo. A questão é esta, muito simples: será que o governo pensa pelo menos olhar de novo para uma eventual alteração do Acordo Ortográfico, o mais cedo possível para que os seus custos não sejam cada vez maiores e se possa repor uma situação de dignidade da língua portuguesa? A esmagadora maioria dos portugueses, que escrevem literatura, que escrevem nos jornais, que falam português, não se revê naquelas coisas absurdas.
António Lobo Xavier [ALX]- Eu secundo.
António Costa, Primeiro-Ministro [AC]- Para mim, acho que não faz sentido mexer no Acordo Ortográfico. Acho que faz sentido deixar que a sociedade evolua naturalmente na sua aplicação.
JPP- Mas para isso não o pode impor obrigatoriamente nas escolas e no Estado.
AC- Ainda hoje há muitas pessoas que escrevem Luís não terminando com s mas com z.
JPP- Mas se for num exame marcam um erro de ortografia.
AC- A minha geração já aprendeu na escola que Luís se escreve com s e não com z, e naturalmente essa evolução se há-de ir fazendo. E acho que temos convivido todos bem e creio que nunca até agora ninguém deixou de compreender aquilo que está escrito.
JPP- Posso interpretar das suas palavras ...
ALX- Eu delego.
JPP- ... como deixando de haver a obrigatoriedade no Estado e nas escolas de impor a ortografia do Acordo Ortográfico? É que isso só é válido se efectivamente a liberdade for maior.
AC- Vm lá ver, o Estado deve praticar aquilo que é estritamente a língua oficial e a fazê-lo.
JPP, caridoso- Está a fazê-lo.
AC- Que para as novas gerações deve ser divulgada e deve ser ensinada a nova ortografia, deve ser brlft, como aconteceu a mim! Eu não sei se foi atingido por algum acordo ortográfico; eu fui* e o António [Lobo Xavier] também deve ter sido. Eu lembro-me, quer dizer, a mim ensinaram-me na escola primária, foi para aí na segunda ou na terceira classe…*
ALX- Mas esse acordo fazia sentido…
AC- Oiça, fazia tanto sentido como o brlft. Vm lá ver, essa é outra questão.
JPP- Mas porque é que a gente não reverte isto? Rapidamente!
AC- Ó Pacheco Pereira, se me pergunta se eu teria tomado a iniciativa de fazer o Acordo Ortográfico, eu diria "não, não teria tomado a iniciativa de fazer o Acordo Ortográfico". A sua pergunta agora é outra: é se tomo a iniciativa de desfazer o Acordo Ortográfico. E eu também lhe digo "não, não tomo a iniciativa de desfazer o Acordo Ortográfico".**
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* António Costa nasceu em 17.Jul.1961. Nessa altura, a reforma ortográfica mais recente datava de 1945. Só em 1973, através do Decreto-Lei n.º 32/73, de 6 de Fevereiro, a ortografia portuguesa de Portugal voltaria a sofrer pequenas alterações que não emergiam de nenhum acordo formal e nada tinham a ver com o senhor Luiz. Correriam os anos de 1968/1969 quando António Costa andava na segunda ou na terceira classe... O menino Costa há-de por certo ter sido atingido — nota-se que foi —, não por um acordo mas por um brlft; disso não quero duvidar.
** Intimassem-no o Partido Comunista Português ou o Bloco de Esquerda a desfazê-lo e veríamos se o não desfaria. A correr e a saltar.
Do doutor António Costa só podemos esperar iniciativas, as que forem mesmo dele, de extrema motivação patriótica. Sem prejuízo, obviamente, do brlft. A língua que se dane.